Jorge Zahar: Uma Biografia através de imagens

Arquivo indisponível

Aluno-pesquisador: 

João Pedro Bragança Rios Alves de Andrade

Orientador: 

  • Professor Bernardo Borges Buarque de Hollanda

Ano: 

2023

Escola: 

  • CPDOC - Escola de Ciências Sociais

Primeiramente, realizei uma pesquisa para aprofundar meus conhecimentos sobre a vida de Jorge Zahar e adentrar-me objetivos do projeto. Primeiramente, sabemos que, por boa parte do século XX, a biografia foi relegada a um “segundo plano” dentro da historiografia (Del Priore, 2009).  O estruturalismo e o marxismo, também como resposta às narrativas históricas heroicizantes, fortaleceram um princípio historiográfico de valorização das grandes massas populares (ib, 2019).

            Em 1979, com a publicação do “Renascimento da narrativa: Reflexões sobre a nova velha história”, Lawrence Stone marca a “volta da narrativa” como um novo 

regime historiográfico (Benatte, 2014). Essa “mudança de paradigmas” (Del Priore, 2019) causou uma importante transformação na historiografia:

 

A explicação histórica cessava de se interessar pelas estruturas, para centrar suas análises sobre os indivíduos, suas paixões, constrangimentos e representações que pesavam sobre suas condutas. O indivíduo e suas ações situavam-se em sua relação com o ambiente social ou psicológico, sua educação, experiência profissional etc. (Ibid, 2019)

 

            Essa perspectiva historiográfica me orientou a trabalhar o acervo de Jorge Zahar. Nos arquivos, temos contato com sua rede de sociabilidade, tanto no âmbito pessoal como no profissional. Na verdade, ao observarmos o acervo, constatamos uma significativa porosidade entre tais esferas. Isso porque, em ambas as suas fases profissionais como editor (na Zahar Editores e na Jorge Zahar Editores), Jorge trabalhou com seus familiares. Além disso, Jorge mantinha relação íntima com amigos, entre muitos deles intelectuais e parceiros editores, como constata-se em fotos de viagem, aniversários, no sítio etc.

            Nesse sentido, pude ir compreendendo ao longo do tratamento arquivístico que, aquelas fotos em momentos descontraídos -registros íntimos e pessoais- também informavam sobre sua atuação pública, uma vez que havia uma nítida interseção entre sua rede profissional e o seu ciclo de amizades. Dessa forma, esse contato com o ambiente biográfico em sua perspectiva histórica foi um ponto de partida para meu trabalho.

            Em seguida, recolhi uma bibliografia justamente para me aprofundar nessa trajetória biográfica de Jorge Zahar. Leandro Nóbrega (2021) destaca alguns pontos muito oportunos para apreciarmos algumas interrelações entre a vida pessoal de Jorge e a “conjuntura coletiva”, por assim dizer. Primeiramente, Jorge era fiilho de mãe francesa, Jorge aprendeu cedo a falar francês. De família pobre e tendo concluído apenas o ensino primário, isso certamente representou um importante capital cultural para a trajetória editorial de Jorge, ainda mais se pensarmos que o foco inicial da Zahar Editores era justamente a tradução.

            Jorge Zahar entra para o ramo do livro através do convite de seu irmão, Ernesto, para trabalhar na Herrera & Cia, na importação e distribuição de livros técnicos, em alta no período do Estado Novo (ibid, 2021). A Segunda Guerra deflagra uma interrupção na atividade editorial global, encerrando as atividades da companhia. Com o suicídio do antigo dono, os irmãos Zahar se juntam ao caçula Lucien compram o espaço e fundam a livraria LER (Livraria Editoras Reunidas).

            Em 1956, a Zahar Editores é fundada, com o foco na tradução de livros das ciências sociais. Jorge foi fundamental como agente literário na intermediação com editoras estrangeiras (Nóbrega, 2022), uma vez que tanto sua experiência no mercado do livro como sua fluência em francês foram determinantes nesse processo. A editora, portanto, definiu como estratégia a criação de linhas editoriais voltadas para as ciências sociais. Diz o autor:

“Ganham destaque, na análise da atuação da Zahar Editores no universo das ciências sociais no Brasil, as estratégias elaboradas pela editora para se inserir no campo editorial (Bourdieu, 2018) diante de outras editoras concorrentes: as redes de interação forjadas com intelectuais brasileiros e estrangeiros, as linhas editoriais lançadas ao longo dos anos e os debates públicos nos quais ela teve atuação fundamental.” (ibid, 2022)

A Zahar Editores buscou fortalecer vínculos com intelectuais brasileiros, especialmente acadêmicos “fora das elites acadêmicas” (ibid). Isso é muito verificável no arquivo, em que muitos intelectuais como Gilberto Velho e seu pai Otávio Velho. Fortaleceu vínculos com o PPGAS-UFRJ e Museu Nacional, intelectuais dos estudos urbanos, o que se verifica nos personagens do arquivo.

Esses personagens aparecem em festas, viagens, cartões-postais e encontros. Um outro material bastante presente no arquivo são as capas de livro, onde podemos também ter uma boa noção da dinâmica que envolvia a linha editorial de Jorge. Vale mencionar que, mesmo após a cisão com os irmãos, Jorge Zahar continuou com uma linha familiar na empresa, visto que seus filhos Ana Cristina e Jorginho e sua neta Cristina Zahar aparecem em vários momentos de trabalho na sede da editora.

Como responsável pela organização do acervo audiovisual do editor Jorge Zahar, meu trabalho consistiu basicamente em catalogar as fotografias do arquivo, organizá-las em dossiês e legendá-las no sistema. Para realizar essa tarefa, me aprofundei na biografia de Jorge Zahar. Os documentos estavam tanto em formato físico quanto digital. Neste último formato, também era responsável pela organização dos vídeos e áudios do arquivo.

Existe um universo histórico que pode ser depreendido de uma fotografia. Vestuários, poses, paisagens, ângulos, pessoas e semblantes são todos aspectos reveladores de matéria histórica e vestígios valiosos para análise. Tratar a imagem como documento, nesse sentido, é necessariamente entendê-la por sua intencionalidade, se afastando de qualquer ideia de isenção.

Tanto esse entendimento como o olhar para o detalhe foram fundamentais para realizar o meu trabalho. Para organizar o material em dossiês, era necessário analisar fotos dispersas, com cenários e pessoas desconhecidas. Nesse sentido, era imprescindível estar atento aos detalhes das fotos, indagar sua intencionalidade, além de analisá-las em conjunto, para compreender e criar nexo entre elas e organizar o arquivo.